dispensado aos filhotes implumes. Durante os brinquedos e folguedos cotidianos, 
qualquer perversidade cometida contra os seres inferiores deixava-o silencioso e severo. 
A censura no olhar era tão veemente que os meninos mais culpados se afastavam 
temerosos. 

Em conseqüência, Jesus não era um menino mórbido, excêntrico ou propriamente 

rebelde; porém, manifestava uma linha de conduta angélica prematura entre os demais 
seres; e por isso semeava constrangimentos nos hipócritas, atemorizava os cruéis, que 
o censuravam, zombando das suas comiserações pelos insetos, vermes ou répteis. 

 
PERGUNTA: — Em face dessa ternura e natureza superior, Maria e José não se 

sentiram felizes de possuir tal filho agraciado por Deus? 

RAMATÍS: — Que poderíeis esperar do entendimento de um povo de pescadores e 

de campônios, cujo índice mais alto de cultura findava na obstinação, fanatismo e 
severidade dos rabis anacrônicos de Nazaré? Para José e sua família, o menino Jesus 
enchia-os de constantes preocupações. 

 
PERGUNTA: — Porventura Maria não guardava no imo de sua alma as revelações 

de ter sido predestinada para dar à luz o Salvador dos homens? Ela não fora visitada 
algumas vezes por um Espírito radioso que lhe previu a sublime maternidade de seu 
filho Jesus? 

RAMATÍS: — O Alto já havia suspendido a freqüência das visões mediúnicas de 

Maria e dos seus familiares, a fim de evitar neles qualquer superexcitação 
transcendental e inoportuna, que os viesse perturbar em sua vida cotidiana e até 
dificultar a vida do próprio menino Jesus. Aliás, diz velho provérbio oriental, que “na casa 
onde nasce um santo, toda a família só vive do seu encanto!” Era conveniente, então, a 
parentela de Jesus não se convencer prematuramente de que ele era realmente o 
Messias tão esperado. 

Aliás, a memória humana é fraca e esquece facilmente aquilo que o homem só 

percebe em profundidade no mundo espiritual. Maria, pouco a pouco, deixou-se 
convencer de que as revelações recebidas do seu anjo de guarda, em vésperas de 
esposar José e de nascer Jesus, talvez não passassem de visões próprias da sua 
imaginação exaltada da juventude. Ademais, seu filho desabrochava no mundo sem 
provocar qualquer fenômeno mais insólito além do seu caráter, que trazia muita gente 
em “suspense”. E também nada lhe fazia comprovar sua natureza altiva e própria de um 
profeta ou salvador de homens, um líder ou comandante capaz de derrotar os romanos 
e libertar o povo judeu. Embora severo contra a maldade, a tirania e o farisaísmo, noutro 
extremo era excessivamente místico, avesso à violência e fujão. E conforme a Lei 
Sideral, que disciplina o equilíbrio emotivo dos seres, justamente Maria, tão sensível e 
mística, privou-se de um contato transcendental para não exorbitar das obrigações 
fatigantes de seu lar, enquanto outras criaturas mais rudes do que ela se sentiam 
sacudidas pelo chamamento do mundo oculto. 

Depois de cessadas as suas visões mediúnicas, a vida de Maria e José ingressou 

no ritmo da existência prosaica das demais famílias judaicas, nada transparecendo de 
que eram realmente responsáveis pelo sublime esponsalício de um anjo com a carne 
humana. De modo algum podiam suspeitar que o menino Jesus tão difícil de enquadrar-
se nos costumes da época e sem qualquer senso de propriedade pelos bens do mundo, 
poderia desempenhar missão tão elevada e difícil, como o Velho Testamento atribuía ao 
Messias, o Salvador dos homens. 

 
PERGUNTA: — Que podeis dizer mais claramente sobre esse “senso de 

propriedade” que não era próprio de Jesus? 

RAMATÍS: — Jesus aproximava-se da juventude com a mente experimentada de 

um adulto; e, o que era mais surpreendente: de um adulto sábio e santo. Em vez de 
criatura prática, metódica, formulando projetos para “vencer na vida”; um provável 
servidor na Sinagoga local; negociante nos entrepostos da Judéia ou mesmo herdeiro 
do ofício de José, ele se obstinava, dia e noite, por um mundo fantasioso e consumia-se 
preocupado com a sorte alheia. Eram especulações transcendentais, sem sentido 

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