raciocínio desenvolvia-se rápido, mas as preocupações prematuras substituíam-lhe, 
pouco a pouco, a alegria espontânea por um halo de melancolia e tristeza. Embora 
menino, já se achava imbuído das inquietações e dos problemas próprios dos adultos, 
algo preocupado em solucionar as vicissitudes da humanidade tão confusa. A idéia mais 
prosaica sofria dele vigorosa análise e lhe provocava reflexões sérias, se nisso estava 
envolvida a ventura alheia. E os velhos rabis da Sinagoga então se punham a dizer, 
meneando a cabeça com ar censurável: “São idéias impróprias para um menino de sua 
idade!” 

 
PERGUNTA: — Jesus cursou alguma escola comum ou fez estudos particulares? 
RAMATÍS: — As possibilidades da família só permitiram a Jesus fazer singelo curso 

de alfabetização para adquirir o conhecimento primário sobre as coisas elementares. 
Deixou de estudar assim que aprendeu a ler e a cantar os salmos e os longos recitativos 
no ambiente severo da Sinagoga de Nazaré, o que era mesmo comum aos meninos 
mais favorecidos pela oportunidade educativa. 

Indubitavelmente, Jesus era uma criança de inteligência incomum para a época, pois 

os seus conceitos e aforismos de elevada ética espiritual, não só surpreendiam como até 
escandalizavam muitos adultos, que jamais podiam aquilatar a realidade do padrão de 
vida angélica aplicado entre os homens cobiçosos. O seu caráter impoluto fazia-o 
transbordar além dos limites traçados pelo senso dos judeus da época, quando defendia 
conceitos de justiça, de desprendimento e dignidade, que chegavam a torná-lo estranho e 
confuso entre o seio do seu próprio povo. Ele despertava censuras aos próprios familiares, 
ou então sofria severas advertências dos mais velhos ou conselhos temerosos dos mais 
púdicos. 

A sua força de libertação era assombrosa, pois sua alma não resistia muito tempo 

no trato demorado com as coisas prosaicas do mundo, malgrado ele dar subido valor a 
tudo o que era manifestação de vida, cujo gosto e interesse lhe delinearam o roteiro 
futuro das maravilhosas parábolas hauridas na Natureza. Mas era incapaz de revelar a 
índole do relojoeiro, que pode operar horas e horas preso ao maquinismo de um relógio, 
ou então entregar-se à pertinácia do laboratorista, que extingue sua vida escravizado ao 
mundo invisível dos micróbios. Embora criança de 10 anos, Jesus visualizava todos os 
acontecimentos, as coisas e os ideais humanos de um modo panorâmico, pois o seu 
espírito recuava facilmente ao passado e projetava-se rapidamente no futuro. 
Surpreendia aquela gente pacata, simples e iletrada, que vivia presa num círculo de 
preconceitos escravizantes e fanatizados à religião tradicional. 

O menino Jesus sentia dificuldades para estudar à maneira dos alunos comuns, que 

aceitam e decoram, sem protestos, tudo o que lhes diz o mestre-escola. Custava-lhe 
absorver-se na nomenclatura convencional do mundo, quanto ao sistema primitivo de 
memorização maquinal. Assim, ele mal tomava contato com as lições áridas da escola 
hebraica, quase desatento aos símbolos das ciências terrenas, nos quais seu espírito 
ilimitado sentia-se embaraçado, como pequeninas teias que lhe cerceavam o vôo pelo 
Cosmo. No entanto, à simples observação de uma bolota, ele concebia o carvalho 
florescente e ante o fiapo de nuvem que passava célere pelo céu, não lhe era difícil 
antever o fragor da tempestade. 

Com o tempo, o próprio mestre-escola habituou-se com as fugas mentais do filho de 

José e Maria, cujo temperamento meigo, por vezes inquieto, casava perfeitamente com o 
seu perfil angélico e prodigamente amoroso para com todos. Algumas vezes ele 
despertava, surpreso, como se fosse arrebatado das nuvens, sob a voz imperiosa do 
professor pedindo-lhe a lição do dia. No entanto, nenhum homem no mundo assimilou tão 
rapidamente tantos conceitos de filosofia, lendas, narrativas, parábolas e conhecimentos 
do mundo, através da escola viva das relações humanas como o fez Jesus. Sua alma, de 
transparente sensibilidade, era um cadinho efervescente, em que de um punhado de 
vocábulos, sob a “química” do seu espírito, formava a síntese de lições eternas. 

 
PERGUNTA: — Mediante vossas considerações sobre a infância de Jesus, 

pressupomos que em face do seu temperamento incomum aos demais meninos, ele 
significava um sério problema para José e Maria? 

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