enquanto os demais apóstolos, aterrorizados, haviam voltado para Getsêmani ou se
dispersado pelo caminho. Pedro saíra a correr, em busca de José de Arimatéia, a fim de
comunicar-lhe o sucedido e pedir-lhe socorro.
PERGUNTA: — Porventura, Judas não se achava presente durante a prisão de
Jesus?
RAMATÍS: — Judas não retornou mais para o Getsêmani, nem teve coragem de
enfrentar o seu Mestre, pois já havia concorrido para a sua prisão, embora a sua
famigerada traição não tenha se sucedido conforme narram os evangelistas. Depois do
fracassso da marcha a Jerusalém, em que ele fora um dos mais entusiastas
organizadores, aliando-se estupidamente aos próprios esbirros do Sinédrio, ali
distribuídos para fomentarem a perda de Jesus, ainda continuou a gozar da amizade dos
mesmos sacerdotes que ele vivia tentando aliciar para o movimento cristão. O Sumo
Sacerdote Caifás conhecia todos os passos de Judas e o acalentava nas suas ingênuas
pretensões. Ele possuía “passe livre” do Sinédrio para transitar por Jerusalém sem ser
incomodado, fato que, havia dias, vinha lançando desconfianças aos demais apóstolos,
pois eles não se aventuravam a se pôr muito a descoberto pelas ruas. Alguns dissídios já
haviam sido acalmados por Jesus, entre os seus discípulos, em face de Judas não dar
satisfações de suas saídas estranhas e freqüentes.
Na quinta-feira, pela manhã, Judas recebeu um amável convite do sacerdote Esdras
para comparecer à casa de Caifás e prestar-lhe o favor de alguns esclarecimentos.
Adorador incondicional dos poderosos, e sentindo-se lisonjeado por essa deferência do
Sumo Sacerdote, o que muito satisfazia à vaidade, apressou-se em atender ao
privilegiado convite. Quando penetrou no vasto salão, onde naquela mesma noite Jesus
seria julgado, estranhou que Hanan e Caifás também estivessem cercados de toda a
família sacerdotal e mais alguns parentes, que se entreolharam significativamente.
Convidado a sentar-se, o velho Hanan, ex-Sumo Sacerdote, mas o cérebro de todas as
tramas sacerdotais, sem muitos rodeios historiou a Judas a situação irremediável de
Jesus e fez-lhe ver a ordem de prisão, já exarada pelo Sinédrio, que só dependia de
uma guarda romana para ser efetivada, conforme era de praxe. Em seguida, insinuou-
lhe que os asseclas mais implicados junto ao subversivo rabino da Galiléia poderiam ser
crucificados pela lei romana, como sediciosos, não escapando a Judas o tom de
advertência quanto a ele mesmo. Judas mostrou-se inquieto, atemorizado e sumamente
nervoso, como era próprio do seu temperamento indócil e começou a perder o controle
emotivo ante aquela inquirição macia à superfície, mas agudamente espinhosa na sua
profundidade. Então, foi convidado a dizer tudo o que sabia sobre Jesus, desde o início
das suas pregações na Galiléia, a sua influência no povo, o contato com os pagãos, a
marcha sobre Jerusalém, a pretensa tentativa de depredações no Templo e
principalmente a extensão da animosidade contra os sacerdotes jerusalemitas.
Em seguida, Hanan oferecia-lhes os meios de Judas sair da Judéia, fornecendo-lhe
provisões e pequena fortuna, protegendo-o até a fronteira do Egito, assim que
satisfizesse todas as inquirições e assinasse aquela investigação de rotina. De princípio,
o infeliz apóstolo negaceou e fugiu de qualquer resposta que pudesse comprometer
Jesus, mas era um temperamento incontrolável, pusilânime e de pouca resistência moral.
Acossado por todos os lados e sob o turbilhão de perguntas capciosas dos membros da
família de Hanan, apanhado em contradições perigosas e traindo-se cada vez mais
diante daqueles homens sabidos e espertos, astutos e implacáveis em seus desígnios,
Judas perdia terreno facilmente. Enfim, aterrado pela ameaça de imediata lapidação
como profanador e perjuro, quando deu por si já havia fornecido dados
comprometedores, embora falsos, e assinado uma confissão, onde a inverdade e a
infâmia forjadas por aqueles homens vingativos transformaram-se na peça acusatória
mais eficiente para eliminar o generoso rabi da Galiléia. A confissão de Judas, mais
tarde, impressionou e convenceu profundamente os juízes do Sinédrio e causou espécie
ao próprio Pôncio Pilatos. Em seguida, o Sumo Sacerdote mandou um beleguim dar a
Judas uma bolsa de moedas, capciosamente oferecida como prêmio ao seu
“testemunho” de livre e espontânea vontade, dado à justiça do Sinédrio. Judas, pálido,
olhos febris e terrivelmente angustiado pelas acusações que já se avivavam na sua
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