Porventura ele seria realmente o Cristo
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tão esperado, conforme lhe dissera João
Batista e ouvia das confabulações misteriosas dos seus apóstolos? Mas Jesus, além de
ser um Anjo era um Sábio, cuja humildade jamais convenceria de ser o Messias
esperado, o Cristo ou o Filho de Deus predito pelos profetas do Velho Testamento. Só
os homens cabotinos, sem o senso crítico da noção psicológica que esclarece a mente,
é que se arvoram ostensivamente em salvadores dos povos, líderes fanáticos ou eleitos
divinos, antes de cumprirem qualquer realização sadia e nobre que os exalte de modo
excepcional.
Contudo, Jesus ainda ignorava que a poderosa “Voz Oculta” que o impelia
estoicamente para a renúncia de sua própria vida em favor do gênero humano, provinha
do próprio Cristo Planetário, que a partir da cena do batismo, no rio Jordão, atuava-lhe
cada vez mais intimamente, fortalecendo-lhe a alma para qualquer desiderato trágico no
desempenho de sua Missão.
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Dali por diante o Mestre Nazareno firmou-se na caminhada
pelo mundo e se deixou conduzir confiante e jubiloso na consecução da obra cristã, em
perfeita sintonia com a sua vocação espiritual. Entregou-se decididamente à pregação da
Boa Nova e do “Reino de Deus” e suas palavras e pensamentos saíam-lhe dos lábios num
influxo tão intenso e caloroso, que seduziam as criaturas mais ferinas e produziam
renovações instantâneas no seus ouvintes. Muitas vezes ele sentiu-se desligado da
própria carne, embriagando-se na efusão espiritual venturosa, que lhe envolvia a alma
heróica, assim como lhe acontecera durante o “Sermão da Montanha” e na
“Transfiguração” do Monte Tabor.
Deste modo, embora Jesus não tivesse certeza absoluta do fim trágico de sua
existência, ele pressentia a necessidade de um sacrifício, que seria o corolário sublime de
sua vida.
PERGUNTA: — Em face de sua condição humana, porventura Jesus também não se
sentia impelido a ajustar-se à vida em comum com os demais homens? Ele vivia
completamente imunizado contra os estímulos e as atrações do mundo?
RAMATÍS: — Muitas vezes a razão humana também tentou dominar-lhe os
sentimentos divinos, compelindo-o a participar normalmente dos prazeres da carne e
atender às exigências naturais de sua ancestralidade biológica. Jesus não podia deixar
de reconhecer que isso também era um direito promulgado por Deus a todos os
homens, pois, em verdade, a existência humana era um curso educativo para o
aperfeiçoamento da alma e de sua conseqüente ventura. Malgrado a sua estirpe
angélica, o Divino Mestre também sentia a necessidade de algum afago compreensivo
que o ajudasse a suportar suas horas angustiosas. Era um anjo exilado num mundo
agressivo e perturbador, levando desvantagem na competição com os habitantes que
nele viviam satisfatoriamente no seu tradicional ramerrão, tal qual o batráquio, que se
sente eufórico na mesma lagoa onde o pássaro sentir-se-ia aflito.
A necessidade de bastar-se a si mesmo, porque já era uma consciência angélica e
um condutor de almas, não o livrara do isolamento espiritual pela falta de companheiros
afins ao seu tipo sidéreo. Nem contava com a companheira afetiva que pudesse ajudá-lo a
vencer as horas cruciantes de sua vida excepcional, muito aquém de sua realidade
sublime. Sentia o cérebro queimar-se pelo excesso de raciocínios comparativos da vida
humana, em confronto com os valores infinitos do Cosmo. Algemado sem culpa à forma
limitativa do mundo terráqueo e sem precisar dessa disciplina educativa, Jesus mal podia
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Realmente, Cristo era palavra grega que também eqüivale a Messias, o Esperado, o Enviado de Israel. Vide
João, 1:34-41: “E eu o vi, e dei testemunho de que ele é o Filho de Deus”. “Temos achado o Messias (que quer dizer
o Cristo)”.
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Lucas, 3:21-23: “E aconteceu que, como recebesse o batismo todo o povo, depois de batizado também Jesus e
estando em oração, abriu-se o céu. E desceu sobre ele o Espírito Santo em forma corpórea, como uma pomba; e
soou do céu uma voz que dizia: “Tu és aquele meu filho especialmente amado; em ti é que tenho posto toda a
minha complacência. E o mesmo Jesus começava a ser quase de trinta anos”. Sem dúvida, isto foi um fenômeno de
alta transcendência mediúnica, em que a pomba refulgente e imaculada era um símbolo evidente da manifestação
do Cristo Planetário, atestável pela vidência dos mais sensíveis. Ainda hoje são muito freqüentes os símbolos
entrevistos pelos médiuns videntes, e que se referem a acontecimentos transcendentais sem analogia com os
fenômenos do mundo material.
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