RAMATÍS: — A Grécia, a Índia e o Egito, quando lembrados por Jesus, acendiam-lhe
novas luzes e por intuição, sentia que a sua alma já operara espiritualmente na
consciência dessas nações. E a sua perspicácia em compreender as multidões,
estudando-lhes a psicologia e descobrindo-lhes as vulnerabilidades nos caprichos, no
sofrimento, na cupidez, astúcia e ingenuidade, tornava-o um pensador inigualável.
O Mestre submetia tudo a exame meticuloso; as menores coisas eram por ele
observadas sob a visão clara do seu espírito universalista. Não situava adversários nem
se sentia alvo da perfídia, da ofensa ou das ingratidões para com a sua generosidade mal
compreendida; classificava o homem terreno segundo a sua imprudência e ignorância, no
tocante a edificar sua ventura espiritual. Em Jerusalém, a sua curiosidade insaciável fê-lo
visitar curandeiros, cartomantes, magos e rabis, sacerdotes e discípulos, profetizas e
astrólogos, hipnotizadores e profetas, escribas e ilusionistas, filósofos e doutrinadores,
escravos e senhores. E de suas observações resultou um conhecimento idôneo de todas
as contradições humanas. Então, confrangido, ele estigmatizava a riqueza egoísta e os
avarentos endurecidos, que se esqueciam dos pobres e dos infelizes.
PERGUNTA: — Uma vez que os quatro evangelhos são relatos dos evangelistas
sobre a vida de Jesus, por que então omitem os aspectos da sua vida durante o longo
período que vai dos 12 aos 30 anos?
RAMATÍS: — Na realidade, após os doze anos, Jesus passou a viver quase sob um
recolhimento espiritual, sem muitas preocupações públicas. Buscava a natureza para
tranqüilizar sua alma aflita; vivia mais a vida mental, reflexiva, numa auscultação
espiritual profunda. Deixou os ruídos do mundo terreno para refugiar-se nas emoções do
mundo espiritual. Deste modo, não se registraram grandes sucessos ou fatos que
ficassem na lembrança do povo. Acresce, ainda, que mesmo a história relatada no Novo
Testamento não é uma descrição objetiva de sua vida, mas sim noções morais e
ensinamentos para os seus seguidores futuros. Não existem dados históricos suficientes
para se escrever a biografia autêntica de Jesus, pois o que chegou até hoje é apenas
fruto da tradição oral e só mais tarde foi registrado pelos evangelistas. Aliás, a
destruição de Jerusalém, por Tito, consumiu quaisquer dados mais objetivos referentes
ao Mestre Jesus, e a história teve de socorrer-se da memória dos cristãos para compor,
pouco a pouco, um relato, aliás, eivado de fantasias, opiniões e digressões pessoais,
embora tudo sob um fundo poético, místico e certa unidade, que lhe exalta a figura
messiânica.
Quando Jesus completou dezenove anos, José de Arimatéia interessou-se
profundamente por aquele jovem místico, inteligente, generoso e cuja vida era
diametralmente oposta aos interesses do mundo. Então fê-lo ingressar nos ambientes
onde se estudavam e se faziam comunicações com os “mortos”, fenômenos ocultos que
naquela época eram conhecidos por “Cabala”. Jesus devotou-se profundamente a essa
doutrina que lhe era eletiva, desafogando o seu espírito no intercâmbio espiritual.
Durante o dia procurava auscultar todas as criaturas que defrontava na existência e à
noite entregava-se aos estudos esotéricos. Mesmo quando, por diversas vezes, tentou
emprego em Jerusalém, sem qualquer êxito técnico ou prático, jamais abandonou suas
investigações do mundo oculto, nem se afastou do contato de José de Arimatéia.
Em verdade, dos 12 aos 30 anos Jesus pareceu evitar qualquer aparecimento no
cenário do mundo profano, como se desejasse mobilizar todas as forças para o
desiderato final do Calvário. Por isso, ninguém lhe encontra feitos de realce ou
movimentos ostensivos que marcassem sua figura no ambiente comum do povo e se
fizesse algo importante para a história situá-lo em destaque. No entanto, se a história
profana ignorou a presença do Mestre no cenário do mundo terreno, jamais alguém na
tradição histórica assumiu o vulto moral da personalidade de Jesus.
PERGUNTA: — Por que se observam certas diferenças entre os relatos dos
evangelhos com relação à vida de Jesus?
RAMATÍS: — João e Mateus falam com mais particularidade do Mestre, porque
sempre o acompanharam em suas excursões e pregações além da Galiléia. Lucas reuniu
notícias colhidas cuidadosamente entre os companheiros de Jesus e de outras pessoas
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