para toda a eternidade!...
E num aceno afetuoso, como a tranqüilizar José, concluiu:
— Eu não me pertenço; mas é a vontade de meu Pai que age em mim e me guia!
Quem me deu a vida tirá-la-á assim que lhe aprouver.
Silenciosamente, encaminhou-se para a porta e voltando-se num último gesto afável
e cortês, exclamou num tom grave, emoldurado por um sorriso angélico:
— Que se cumpra em mim a vontade de meu Pai!
José achegou-se à janela de sua modesta habitação e seguiu com os olhos úmidos
o vulto majestoso de Jesus, caminhando lentamente entre os narcisos, íris e anêmonas,
que marginavam o caminho da fonte. O silêncio da tarde que se findava e a pureza da
atmosfera faziam vibrar os leves estalidos de suas sandálias sobre a areia miúda, que
refulgia sob os derradeiros raios do sol deitando-se no poente. O jovem Jesus
caminhava sobre a terra, mas a sua alma mergulhava no Infinito. A natureza, em torno
dele, silenciosa e quieta, parecia auscultar os seus pensamentos grandiosos ou as
aflições crepitantes, que lhe ardiam no coração. Ele subiu num pequeno outeiro,
encimado por uma cúpula de pedras e sentou-se ali, entre os tufos esverdeados,
pontilhados de florinhas silvestres. Espraiou seu olhar sublime sobre a planície
verdejante, os bosques, os caminhos dos pastores e a estrada que margeava o Jordão e
depois rodeava o monte Tabor, onde mais tarde ele teria avançada visão mediúnica do
mundo espiritual. Ao longe, o mar da Galiléia brilhava, ondeando lantejoulas faiscantes,
que se fragmentavam ante os reflexos do sol. Os pescadores preparavam as redes para
a madrugada e as barcas manchavam a superfície da água com tons coloridos, desde o
índigo até ao amarelo-claro. A brisa cariciosa que descia das encostas de Nazaré movia,
de leve, os barcos miúdos e também agitava os cabelos sedosos de Jesus.
Jesus cruzou as mãos sobre o peito e cerrou os olhos. Um longo suspiro de infinita
saudade fluiu de seu coração. O silêncio da tarde munificente de cores, perfume e
poesia, o céu tarjado de luz crepuscular descendo sobre a cabeleira verdejante dos
ciprestes e dos cedros esguios, acendia matizes de púrpura, ouro e rosa no formoso
cenário da Galiléia beijada pelo Sol da tarde. Lembrava talvez a paisagem sonhada por
Jesus. Era a moldura atraente e sugestiva amostra do Paraíso, fazendo brotar de sua
alma a ternura, o amor e a paz de espírito.
Então, o Divino Amigo da humanidade se deixou deslizar, de leve, os joelhos em
terra. E recostado no suave outeiro de pedras e flores, de mãos postas, em atitude de
prece, ergueu os olhos para o alto e sua alma entreabriu-se para o Senhor, num
angustioso apelo, onde a volúpia do sacrifício confundia-se com o mais puro e exaltado
Amor pelo gênero humano.
— Pai! Que a vossa vontade se cumpra em mim até a última gota do meu sangue!
Era o primeiro vislumbre consciente do seu holocausto no Calvário; intuição viva do
motivo principal de sua vida na matéria e que o arcanjo Gabriel, seu guia, aproveitou
naquele momento tão extasiante e de sintonia espiritual para sussurrar-lhe a
proximidade dos passos messiânicos. Daquele instante para a frente, definira-se um
propósito e se projetara o ideal que trazia do berço e lhe consumia a vida física. A
“agulha” do seu coração apontava para o Norte do Calvário e já não guardava dúvida de
que sua obra exigiria o sacrifício de sua vida em troca da salvação do homem.
No dia seguinte, quando ele desceu a encosta até às margens do Tiberíades, Pedro
aceitou-lhe o convite e largou as redes de pesca para segui-lo. Eram realmente os
primeiros passos da sua Paixão, no cumprimento da vontade do Senhor.
PERGUNTA: — Em face do seu elevado quilate angélico, Jesus não poderia ter
prescindido de qualquer sugestão alheia quanto à sua obra, inclusive de seu pai José?
Quer-nos parecer que ele sempre modelou os pensamentos e palavras mediante
reflexões pessoais. Estamos certos?
RAMATÍS: — A Técnica Sideral protegeu o equipamento carnal de Jesus tanto pela
sua ascendência biológica, sadia, como pela cooperação e presença de José, pois até as
espécies florais mais delicadas requerem maiores cuidados do jardineiro, a fim de não
sofrerem afluxo demasiado da seiva agressiva do caule. José, espírito austero, digno e de
sentimentos elevados, graças à sua condição de pai carnal, protegeu e influenciou Jesus,
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