queimando-os no fogo do sacrifício e da abnegação fraterna, passando a devotar o 
Mestre e esquecendo o homem. 

 
PERGUNTA: — Podereis dar-nos alguns aspectos dos motivos ou sentimentos que 

atuaram tão veementemente em Maria Madalena, a ponto de ela abandonar tudo o que lhe 
era simpático e valioso para entregar-se ao comando de Jesus? 

RAMATÍS: — Maria de Magdala era um espírito generoso e afidalgado, que há muito 

tempo se sentia enjoado dos prazeres inferiores da carne, ansiando por encontrar um 
amor puro, sem paixão egocêntrica, um coração amigo a que pudesse confiar suas 
amarguras, seus sonhos desfeitos e a sua ansiedade espiritual. Ela sabia que os seus 
cortejadores mais apaixonados e ciumentos não passavam de homens fesceninos, 
ególatras e violentos, que depois de fartos em seus desejos, não tripudiariam em deixá-la 
atirada no monturo dos párias do mundo. Eles guardavam no âmago um desejo de 
desforra, porque as migalhas que lhes dera do seu amor haviam sido conseguidas a peso 
de ouro e de servilismo, algo humilhante para o amor-próprio masculino. 

Seu corpo formoso, seus encantos e a fidalguia de mulher culta e de bom tratamento 

pessoal acendiam ciúmes, paixões e cobiça entre os seus conterrâneos e entre os 
próprios patrícios romanos. As outras mulheres consumiam-se de inveja e despeito, 
porquanto só ela lograra a fortuna pródiga e o poder avassalante sobre os homens. Seu 
castelo à beira do formoso lago, seus jardins rutilantes de flores raras, trazidas dos mais 
longínquos países através da influência de seus adoradores, sua biga faiscante de ouro e 
prata, puxada pela parelha de zebras da mais pura raça; seu horto de ervas odorantes 
onde se faziam os mais famosos perfumes da Judéia, eram causa dos mais 
contraditórios sentimentos dos hebreus. Maria de Magdala sabia quanta inveja e ódio 
também se disfarçavam no imo dos louvores, das homenagens e dos tributos que lhe 
dispensavam os mais servis. 

Espírito de boa estirpe sideral, não abandonava os deserdados da sorte, mas 

sentia-se sozinha no seu mundo, como se tudo silenciasse de um momento para outro 
em seu redor. Embora cercada pelo fausto e pelos admiradores que ela movia depois 
pelos caprichos da sua vontade, sentia-se completamente desligada de tudo. 

Maria de Magdala vivia espiritualmente desesperada, reconhecendo a necessidade 

urgente de trocar aquela vida daninha por um viver simples e limpo, em que um sorriso 
alheio lhe fosse sincero e amigo, e um gesto de louvor partisse da amizade pura, em vez 
do interesse vil e inconfessável do prazer carnal. Eis que, então, lhe falam de um rabi 
amoroso, sábio e puro, que pregava um reino de amor e bondade, no qual até as feras 
viveriam em paz com os cordeiros e todos os seres entrelaçados no amor mais puro. 
Diziam-lhe que Jesus era magnânimo, justo, leal e amigo sincero do rico e do pobre, do 
sábio e do ignorante, do sadio e do enfermo, do santo e do criminoso, do senhor e do 
escravo, da mulher digna e da prostituta. Assim, quando, após o seu olhar provocante e 
quase sensual, Jesus a fitou e a envolveu com o magnetismo da mais pura afeição 
espiritual, Maria de Magdala sentiu-se afogueada e aflita, convicta de que Jesus, 
realmente, reunia todas as qualidades excepcionais, que ela jamais pudera imaginar num 
só homem. 

Inúmeras vezes ela havia tentado libertar-se daquela vida dissoluta, embora lhe 

proporcionasse fortuna; mas a decisão salutar sempre fracassava, quer por falta de 
motivo elevado, como devido à capciosidade do homem. No entanto, Jesus lhe 
significava o milagre desejado há tanto tempo, pois ele se apiedara dos seus pecados, 
frutos da lascívia dos homens e parecia ignorar sua ignomínia. Embora o corpo carnal 
de Maria Madalena ainda se prendesse à corrupção do mundo, há muito tempo o seu 
espírito vinha tecendo sonhos de libertação espiritual, tal qual o pássaro que, embora 
preso ao lodo, não deixa de envidar os mais heróicos esforços para alçar o seu vôo 
libertador e retornar aos píncaros de sua moradia feliz. Ela sonhava com a chuva 
espiritual benfeitora, que lhe apagasse o tormento da alma angustiada; seria capaz de 
doar toda a sua fortuna e aniquilar sua fama deslumbrante, se pudesse alimentar a alma 
com o afeto puro do amor espiritual. 

Ante Jesus, ela sentiu que a escória da animalidade inferior recuava sob o impacto da 

sua luz angélica, ensejando-lhe o caminho da redenção tão ambicionada. Ele significava-

124