Desaparecera a mulher envaidecida de seus próprios encantos, habituada a divertir-se
com a avidez dos olhares cobiçosos dos homens. Ante o olhar franco e puro do Mestre
Cristão, ela foi apenas uma tímida criança, que só ousou encará-lo quase assustada.
Mas Jesus sorriu-lhe e o seu olhar angélico derramou-se sobre ela como a linfa pura
caída dos céus sobre a terra ardente e ressequida. Maria de Magdala levou a mão ao peito
e quase sucumbiu ao solo sob a emoção de tanta alegria.
PERGUNTA: — Mas conhecemos obras que apontavam Maria Madalena como a
paixão humana de Jesus, e que ela também o amou fisicamente.
RAMATÍS: — Como vo-lo dissemos, Maria de Magdala, tendo ouvido falar dos
atributos santificados de Jesus, quis divertir-se e desafiá-lo com sua beleza provocante,
certa de comprometer com a paixão física o rabi famoso por suas virtudes. Tendo
encontrado o Mestre numa das tradicionais assembléias públicas, ou também conhecidas
por sinagogas, perto do lago Tiberíades, em que os presentes podiam consultar ou
interrogar os rabinos que as dirigiam, chamou-lhe a atenção com perguntas insistentes,
enquanto o fitava provocantemente, tentando confundi-lo na sua prédica. É verdade que
Maria de Magdala chegou mesmo a despertar uma afeição extrema em Jesus, e se
percebia nele um prazer muito humano ao tornar a vê-la.
No entanto, jamais Jesus amou fisicamente Maria de Magdala, pois o seu porte
moral e sua fidelidade à obra cristã, que era o seu sonho dourado no mundo, afastavam-
no de qualquer objetivo vulgar do mundo. Não há dúvida de que ele não tardou a
perceber que ela fora vítima de sua própria imprudência, pois passara a amá-lo
desesperada e ardentemente. Mas Jesus decidiu-se a vencer aquele amor tão tentador
e salvá-la de sua vida impura e delituosa, passando a tributar-lhe um afeto terno e
paternal, que pouco a pouco deu-lhe força espiritual, ajudando-a a vencer a paixão
abrasadora em troca da ternura fraterna. Exausta da falsidade dos seus mais ardentes
admiradores, que apenas lhe cobiçavam os encantos femininos e jamais lhe seriam tão
nobres e desprendidos como Jesus, ela não podia suster o seu recalque abrasador de
criatura humana, ainda incapaz de sentir as emoções superiores do reino imponderável
do espírito. Mas essa paixão menos digna, dos primeiros dias, não tardou a transformar-
se no mais puro sentimento de idolatria espiritual, convertendo-a, incondicionalmente, ao
messianismo redentor da obra cristã.
Jesus, entidade que já havia superado a ilusão da forma humana, cuja descida à
Terra lhe custara imenso sacrifício espiritual, jamais poderia se comover ou se fascinar
pela beleza e pelos encantos físicos de qualquer mulher, que ele não considerava além
de uma irmã digna de ser venturosa. A vida material não lhe despertava qualquer
impressão ou desejo anormal porque, através das coisas do mundo físico, ele só
vislumbrava o espírito eterno que a sustinha. A criatura mais bela, diante dele era
apenas um maquinário vivo, cujas peças constituídas de átomos, moléculas e células, só
eram dignas de um exame técnico e não cobiçoso. Cada homem e cada mulher não
passavam de instrumentação provisória atuando momentaneamente no mundo material,
a fim de o espírito apurar a sua sensibilidade psíquica e desenvolver a consciência
eterna. Espírito “auto-realizado”, senhor de toda a trama da existência física e do
planejamento espiritual do Espaço, jamais o seu coração sacudiu-se sob a
intempestividade da paixão humana, pois, como disse Buda, “a paixão é como a flor que
se entreabre pela manhã e murcha à tarde”.
Maria de Magdala não poderia induzir Jesus a uma paixão transitória da carne, pois
em sua inconfundível honestidade, jamais ele cederia em doar o seu amor puro e
piedoso para uns e menos para outros. A sua família e seus amigos, discípulos,
adversários, pecadores, algozes e traidores, ele os reuniu, mais tarde, em espírito, no
alto da cruz, identificando todos numa só frase, em que resumiu o seu mais veemente
sentimento espiritual de ternura para com o gênero humano, assim se expressando:
“Pai! Perdoai-lhes, pois eles não sabem o que fazem!”
Maria Madalena, espírito inteligente, culto e sensível, não tardou em perceber que,
em face da natureza angélica de Jesus, não havia combustível no seu coração que
pudesse alimentar aquela paixão de natureza carnal. Por isso, num esforço heróico de
renúncia absoluta, ela sufocou os brados apaixonados do seu coração e sublimou-os,
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