os que são da vossa carne, pois com eles ainda vivereis.”
Os apóstolos se entreolharam, surpresos, mas confiantes. Súbito, deram por si que
Jesus se encaminhava, como de costume, para orar no cimo do Horto. Então ergueram-
se, num só gesto, para acompanhá-lo; mas ele os susteve, dizendo afetuosamente:
— “Assentai-vos aqui, enquanto eu vou acolá e faço oração”.
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Mas Pedro, João e Tiago não se deram por vencidos e seguiram o Mestre subindo
pelo caminho florido do Horto, enquanto os demais companheiros, algo fatigados,
continuaram à frente do celeiro, alguns acendendo lanternas e outros, archotes. Mas o
Mestre Jesus, que havia fornecido tanto ânimo e esperanças, subitamente passou a
angustiar-se sob a tensão oculta de pesada responsabilidade. Não era o medo do
homem ante a perspectiva da morte, pois ele sentir-se-ia ditoso em retornar ao seu
mundo paradisíaco. Também não se entristecia de deixar a Terra, na qual não possuía
outros vínculos além de sua renúncia e o seu amor ao gênero humano. Mas apesar de
sua resignação e conformação, pressentia que o seu próximo testemunho seria de
grandiosa influência para a redenção do homem. Sábio, Justo e Bom, mas submerso na
matéria, Jesus ignorava como se portaria nessa prova excepcional de cujas
conseqüências dependeriam o êxito e a sobrevivência de sua obra evangélica.
Deixando João, Tiago e Pedro a meio caminho, pois desejava orar a sós, alcançou o
cimo do monte das Oliveiras e ali descansou alguns minutos na mais santa comunhão
espiritual com a natureza. Sob a excelsa vibração que lhe influenciava a alma, pôs-se a
reviver todos os seus passos assinalados no mundo material. Recordava os seus
sonhos grandiosos de amor pela humanidade e a sua paixão ardente pelo Senhor da
Vida, agasalhados desde a mais tenra infância e alentados até aquele profético
momento. Jamais alguém no mundo consumiu-se tanto no fogo do amor ao próximo e
no sacrifício pela Verdade. O Mestre Jesus foi arrebatado por tão grandiosa e indefinida
emoção, que prostrou-se de rosto na terra, como se desejasse fundir a sua natureza
espiritual com a substância do mundo que lhe compunha o próprio corpo carnal. Depois,
abriu os olhos para a noite quente e estrelada, envolto por infinita paz. Mas, de súbito,
sentiu-se pouco a pouco transformado num frondoso arvoredo pejado de ramos
carregados de folhas e frutos, que amparavam todos os infelizes e injustiçados do
mundo ali chegados em busca de sua sombra dadivosa. Sob a assistência do Alto,
Jesus reviu nessa ideoplastia mediúnica o “motivo fundamental” de sua própria vida na
matéria, ante o compromisso fabuloso que assumira antes de descer à carne, pois essa
árvore protetora nutria-se com o adubo fértil do seu próprio sangue vertido no martírio.
Embora angustiado, sentiu-se extremamente feliz ao comprovar que sobreviveria a
sua obra evangélica redentora da humanidade, malgrado isso lhe exigisse o holocausto
da vida e a doação de seu sangue. Represando as próprias emoções de anjo exilado na
carne, Jesus então sentia-se como um “canal vivo” ou o “élan” da salvação dos homens,
enquanto crescia-lhe a imensa dor espiritual ante a dúvida angustiada de não
corresponder integralmente à vontade do Senhor. Prosternando-se novamente no solo,
de mãos postas, exclamou com todo o fervor de sua alma: “Pai meu! Que se cumpra a
vossa vontade. Eu não temo o martírio e a morte, porém, ajudai-me a conhecê-los para
saber enfrentá-los.”
Novamente sublime vibração sideral tomou-lhe a alma e o seu espírito parecia
libertar-se cada vez mais das formas agrilhoantes da carne. Súbito, sua mente foi
atingida por repentino fulgor ou rápido relâmpago, enquanto se clarificava na sua
consciência física a silhueta trágica de três cruzes erguidas no cimo de uma colina.
Envolto por augusto silêncio, ele percebia nesse novo transe a forma da Terra e os
contornos das cidades, onde os homens dormiam tranqüilamente. Mas ele, Jesus, é
quem realmente velava por esse sono ditoso dos terrícolas, suspenso entre o reino do
espírito e o mundo da matéria, com seus braços abertos e atados sobre uma cruz.
Porém, ultrapassando aquela dor extrema e inumana, que o desprendia da carne, e
vibrando sob o elevado impacto de voltagem sideral, ele sentia, então, na própria alma,
estranho fenômeno que absorvia toda a vivência interna. Num extremo, a pulsação e o
rodopiar dos astros, das constelações e galáxias; e noutro extremo, o vibrar dos átomos
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Mateus, 26:36.
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