primeira vez denominados os seus “apóstolos”, Jesus afastou a cortina e o seu vulto
majestoso desapareceu nas sombras da noite estrelada, envolto pela brisa perfumada
do jardim de Getsêmani.
PERGUNTA: — Dizem os evangelhos que houve resistência de Pedro contra a idéia
de Jesus lavar-lhe os pés, pois não se sentia digno de tal dedicação.
RAMATÍS: — Tratava-se de uma cerimônia habitual entre Jesus e seus discípulos
desde o tempo de João Batista; por isso, não havia motivo para a recusa de Pedro. Em
verdade, durante o momento do “lava-pés” o Mestre o fazia a cada discípulo, explicando-
lhes as razões do ato e o que significava o seu simbolismo para o futuro. E o próprio
Jesus, repetindo a indagação de todos os anos, após a cerimônia, assim se expressa aos
discípulos, dizendo: “Sabeis o que vos fiz?” E conforme narram os evangelistas, eis o seu
pensamento a respeito do “lava-pés”: “Desde que vós me considerais o Mestre e Senhor,
e eu assim o aceito e vos lavo os pés, deveis vós também lavar os pés uns aos outros,
porque eu vos dei o exemplo; e assim o fareis aos vossos discípulos quando vos fizer
mestres. Perante o pai, o Mestre não é maior do que o servo; nem o servo é maior do
que o mestre. Aquele que lava os pés do discípulo ou do servo é então grande perante o
Pai, porque por si mesmo se faz o menor”.
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Aliás, afora João, os demais apóstolos ignoravam que a cerimônia do “lava-pés” já
fazia parte integrante do rito dos Essênios, como a fase iniciática característica do
discípulo que deixa o mundo profano para ingressar no “Círculo Interno” do mundo
espiritual. Além daquele sentido de humildade explicado por Jesus, como deliberada
demonstração de que o “menor” na Terra é o “maior” no Reino de Deus, ainda existia a
significação de que só o Mestre sabia consolar os seus discípulos e servos e aliviar-lhes
as dores e as vicissitudes sofridas nos caminhos e nas sendas do mundo transitório da
carne. Sobre os pés cansados, empoeirados e feridos, concentravam-se as dores e o
sofrimento das longas caminhadas dos discípulos entre as desilusões e hostilidades da
vida humana. Então o Mestre os lavava com sua ternura, humildade e paciência,
deixando-os limpos e aliviados para nova caminhada.
PERGUNTA: — Ainda com relação à última ceia gostaríamos de sanar nossas
dúvidas quanto ao fato daquela acusação de Jesus insinuando ser Judas o discípulo
que deveria traí-lo.
RAMATÍS: — Entre os diversos acontecimentos narrados pelos evangelistas e
sumariamente modificados posteriormente pelos exegetas católicos, a cena da
acusação indireta de Jesus contra Judas, se fosse verdadeira, seria um dos mais graves
e censuráveis desmentidos aos seus profundos sentimentos de amor, ternura e perdão
tão sublimes, que, nos extremos de sua agonia, no ato de sua crucificação, quanto aos
seus algozes, o fez dirigir ao Pai aquela rogativa de misericórdia infinita: “Pai! Perdoai-
lhes porque eles não sabem o que fazem”.
É quase inacreditável que, depois de se configurar o Amado Mestre como a maior
expressão de amor e de renúncia na Terra, o reduzam ao caráter de um homem comum
ressentido e intrigante, pecando pelo julgamento antecipado da “possível” traição de um
discípulo.
Conforme narra o evangelista João, (13:21-30), primeiramente Jesus exclama: “Em
verdade, em verdade vos digo que um de vós me há de entregar”. Após os apóstolos
recuperarem-se da angústia daquela acusação velada e, em seguida às indagações
aflitivas de Pedro e João, eis que o Mestre, num gesto de delator vingativo responde: “É
aquele (o traidor) a quem eu der o pão molhado. E tendo molhado o pão, deu-o a Judas,
filho de Simão Iscariotes”. E a narrativa de João acrescenta: “E atrás do bocado de pão
entrou em Judas o Satanás.”
Em tal acontecimento tão comprometedor, faltaria ao Mestre, sempre gentil e
benevolente, até o resquício da piedade comum nas criaturas de relativa formação
moral, pois ele teria acusado o seu discípulo em público, por um ato abjeto de que
apenas tinha pressentimento. Mateus, (26:21-25), não descreve a cena do pão molhado
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Nota do Médium: Essa exortação de Jesus descrita por Ramatís pode ser apreciada, em parte, em João, 13:4-17.
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