PERGUNTA: — Como procedeu Jesus para modificar essa situação espinhosa 

entre os seus próprios discípulos e partidários, que se mostravam cada vez mais 
indiferentes ou desanimados, devido à rotina das peregrinações pela Judéia? 

RAMATÍS: — Tendo reconhecido a infiltração de sentimentos de discórdia, 

hesitação e inconformidade entre os seus fiéis amigos e seguidores, o que, dali por 
diante, dificultaria o ritmo produtivo das pregações evangélicas, Jesus preocupou-se 
realmente com esse problema grave. Sem dúvida, sua obra sofreria sério desgaste se a 
dissidência, o ciúme ou as desavenças viessem a tornar-se públicas e servirem de 
exploração capciosa aos inimigos da causa cristã. Ademais, o sacerdócio de Jerusalém 
não só admitia o perigo das idéias revolucionárias de Jesus, como se mostrava 
enciumado de suas pregações cada vez mais bem acolhidas pelo povo numeroso e 
entusiasta. Caifás havia ordenado severa vigilância sobre o rabi de Nazaré, exigindo um 
relatório diário de todos os seus passos e aconselhando aos seus esbirros que tudo 
fizessem para inculpá-lo, o mais breve possível, ante as autoridades romanas. 

Assim, em primeiro lugar, Jesus procurou solucionar o problema da vida em comum 

dos seus discípulos, auscultando-lhes as dificuldades e as obrigações com a família e 
outros deveres prosaicos do mundo. Reservou as tarefas inadiáveis e mais urgentes 
para os solteiros, desobrigando os casados para atenderem com mais freqüência aos 
problemas da sua parentela. Em seguida, pôs-se a refletir quanto ao modo de variar a 
forma de suas pregações evangélicas mantidas há três anos, a fim de avivar a alma de 
todos os seus fiéis. 

No entanto, malgrado a sabedoria e os sentimentos tão elevados de Jesus, jamais ele 

poderia alterar o ritmo encantador de suas prédicas, dispensar o emprego daquelas 
parábolas de terna penetração espiritual, ou abandonar os lagos, os montes e os lugares 
pitorescos da natureza, que tanto lhe serviam de moldura poética. Eram sermões simples, 
afetivos e facilmente compreensíveis por todos os ouvintes, cujas palavras se 
emolduravam pela ternura, esperança e pelo amor que fruíam daquele reino de encanto e 
beleza extraterrenos. 

Não havia dúvida: os pobres, os infelizes e os enfermos continuavam a segui-lo 

docilmente e esperançados, mas faltavam os milagres convincentes, à luz do dia, pois 
os que eram narrados sob excessos de imaginação não convenciam e isto aumentava a 
vacilação na fé e na crença das multidões. Jesus era o profeta querido, o rabi adorado, o 
homem justo e bom, mas as almas primitivas, como as crianças, em breve cansam, 
quando submetidas à disciplina severa ou às normas de boa conduta, que não 
proporcionam compensações imediatas. Inúmeras vezes, Jesus lhes havia dito que 
“Deus alimenta as avezitas e veste os lírios dos campos” e acrescentava que isso Ele 
também faria com os seus filhos. No entanto, para aquelas mentes interesseiras, 
preocupadas exclusivamente com a sua própria ventura — aliás, espíritos submetidos 
ainda às provas cármicas da pobreza, doença e humilhação — só lhes animaria a fé 
titubeante o que fosse visível, positivo e imediato. Obviamente, o Mestre teria de 
mobilizar novos recursos algo atraentes para sustentar aquela gente no mesmo 
diapasão de ânimo e confiança em suas palavras e esperanças no futuro. 

Mas as suas providências não chegaram a se concretizar em tempo, pois o mês de 

março chegava ao fim e ele foi crucificado alguns dias depois, em princípios de abril, na 
sexta-feira próxima da Páscoa, No entanto, assediado pelos seus apóstolos e 
principalmente por Pedro, que também se deixara impressionar pela opinião de 
centenas de partidários da causa cristã, Jesus se deixou mover por estranho impulso 
oculto e resolveu atendê-los, seguindo para Jerusalém e ali pregar a sua doutrina 
durante as festividades da Páscoa. Sempre relutara quanto a essa viagem a Jerusalém, 
o que considerava um evento prematuro para as suas pregações impregnadas da 
poesia e do encanto provincianos da Galiléia. Temia a recepção frígida dos 
jerusalemitas, sempre sarcastas para com as idéias e os empreendimentos dos galileus, 
ou ser motivo de escárnio ao enfrentar, em público, os sacerdotes duros de coração, 
embora hábeis e astuciosos malabaristas das letras e dos sofismas. Sem dúvida, sua 
obra seria desgastada em Jerusalém, com sérios prejuízos para o futuro, caso 
retornasse a Nazaré frustrado e humilhado. Tomé, cauteloso e ponderado, considerou 

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