estavam na índole quase geral.
Deste modo, Jesus não fazia falta junto à família, nem sua inatividade era motivo de
prejuízo ou desdouro para a comunidade de Nazaré. Também não arregimentava
acólitos, desviando-os de seus lares para seguirem-no estrada afora, porque estes
acompanhavam-no depois de guarnecerem suas famílias de todas as necessidades e
seu retorno era breve! Na condição de rabi itinerante, Jesus atendia a uma das tarefas
mais imprescindíveis daquela gente, correspondente às ansiedades espirituais de todos,
afeitos a uma religiosidade fanática. Tanto o Mestre como os seus seguidores
contentavam-se com as migalhas que sobejavam das mesas e vestiam-se com
simplicidade, aceitando as sobras dos lares mais fartos sem pesar na economia local.
Eram frugais na alimentação, como cultores de uma virtude própria do “reino de Deus”,
completamente despidos de quaisquer outros objetivos que não fossem sua tarefa
messiânica. Prevendo-se os dias em que a caravana do Mestre Jesus se manteria em
atividade nas cidades ou lugares adjacentes, quase todos os moradores, num esforço
coletivo, providenciavam os meios para que os viajantes não viessem a sofrer qualquer
necessidade, no tocante aos alimentos e hospedagem. Hoje também se repete essa
disposição emotiva e espiritual entre os espíritas, que se sentem felizes e eufóricos em
proporcionar bom acolhimento aos confrades, oradores e doutrinadores, que passam por
suas cidades, a serviço do Espiritismo.
Quando isso acontecia, então recrudescia-se a pesca, o cozimento de pães, a
moagem de trigo, a preparação de conservas, a secagem de peixe, a fabricação de
geléias, biscoitos, mel de figo. Aumentava-se a feitura da farinha de centeio e de trigo, a
destilação de xaropes e a produção de sucos de laranja, pêssego, maçã e o dificílimo
caldo de cerejas. Era uma festa emotiva para aquele povo despido de acontecimentos
insólitos. As mulheres trabalhavam alegremente para cooperar no êxito e na divulgação
da Boa Nova trazida pelo profeta de Nazaré. Eram confeccionados delicados farnéis
para a jornada mais longa do rabi e dos seus fiéis; um ou mais burros seguiam, à
retaguarda dos peregrinos conduzindo as provisões necessárias para o sustento de
todos durante as pregações. A ternura e a alegria confraternizavam todos e os deixavam
sumamente felizes pela oportunidade de participarem mais ativamente no advento da
doutrina cristã.
Em face do espírito de hospedagem e solidariedade que predominava entre a
maioria dos judeus da época, Jesus, seus discípulos e seguidores, conduziam reservas
abundantes e terminavam por distribuir grande parte de suas provisões e rações aos
deserdados que encontravam durante sua peregrinação, comprovando a feição terna e
gentil da caridade e do amor ao próximo, ainda patente no seio do Cristianismo. Os
leprosos, atirados aos grotões e às furnas que marginavam as estradas, eram
constantemente visitados pelos pregadores da nova crença, recebendo deles não
somente alimentos e vestes necessários para o corpo físico, como ainda a palavra
amiga e confortadora do amoroso rabi. Quando todos retornavam felizes e eufóricos
para seus lares com a alma satisfeita pela alimentação espiritual do amor, que é o traço
essencial da contextura do anjo, depois de suas incursões pela Judéia, divulgando o
reino de Deus a todas as gentes, então eram recebidos amorosamente pelos seus
próprios familiares, com festas e demonstrações afetivas do mais puro sentimento. Os
que ficavam à retaguarda, cuidando das coisas prosaicas da vida em comum, ainda se
davam por felizes ante o ensejo de participarem humildemente da obra do Mestre Jesus.
É por isso que nos relatos evangélicos é possível identificarmos a profunda
afabilidade que sempre existia e unia os apóstolos e suas famílias, cada vez mais
expansivas pela adesão de outros membros e parentes à missão de Jesus, o qual era o
primeiro a não permitir sacrifícios alheios para ele transmitir a palavra do Senhor, pois
em sua natureza profundamente honesta, mística e generosa, sentia-se o único
responsável pelos óbices e sacrifícios que porventura adviessem na pregação do
Cristianismo. Ele administrava tão sabiamente sua tarefa messiânica, que a história
religiosa nos fala da ordem, disciplina e obediência que reinavam entre ele e seus
discípulos, propondo soluções e sugerindo providências que não exorbitassem do bom-
senso.
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