facetas da especulação iniciática dos templos e os mais complexos tabus tornavam-se 
brinquedo de criança. A compreensão da imortalidade tornava-se cada vez mais simples 
entre o povo rude e inculto, que entendia facilmente o generoso rabi. Ele evitava as 
argumentações teológicas, as exortações áridas e quilométricas, nem apelava para os 
quadros estentóricos com o fito de valorizar a sua oração. Descrevia o “reino de Deus” 
com as palavras e as imagens conhecidas por aquela gente simples; eram símbolos da 
própria vida humana nas mais claras comparações objetivas. Aqui, aludia ao grão de 
mostarda, à espiga dourada, ao trigo e ao joio; ali, aos talentos enterrados, ao fermento 
que leveda a massa, à pérola de grande valor, à rede e à pesca; acolá, suas lições, seus 
apólogos e aforismos giravam em torno do filho pródigo, das bodas do filho do Rei, do 
bom Samaritano, do rico e de Lázaro, do juiz iníquo, dos servos inúteis ou dos 
trabalhadores da vinha. Tudo muito claro, incisivo e comovente, fácil de ser divulgado 
pelos mais hábeis iletrados e compreendido pelos mais obtusos. 

Mas, repetimos, nem todos aceitavam Jesus, malgrado sua gentileza, ternura e 

sublimidade, pois naquela época os interesses humanos, tanto quanto hoje ainda 
acontece, dividiam as criaturas de conformidade com os seus objetivos egoístas ou 
paixões. O reino que o Mestre pregava pedia, de início, a abdicação do interesse 
egoísta e do utilitarismo do mundo; insistia na humildade, na cessão de bens em favor 
dos mais necessitados, coisa que não podia ser bem aceita pelos ávidos, cúpidos e 
especuladores, inimigos milenários de quaisquer reformas sociais. Nem mesmo todos os 
galileus submetiam-se aos ensinos de Jesus, pois não querendo prejudicar os seus 
interesses, não se integravam no conteúdo evangélico do que ouviam. 

PERGUNTA: — Supomos que, se Jesus exercesse qualquer função prosaica no 

mundo, ele não poderia dedicar-se tão eficientemente à sua doutrina e às peregrinações. 
Não é verdade? 

RAMATÍS: — O povo judeu considerava os seus rabis como uma instituição 

tradicional e mesmo necessária para a solução dos milhares de problemas e dúvidas 
que surgiam a cada passo entre os discutidores e aprendizes. Eles atendiam as 
ansiedades espirituais, em público, semeando conceitos benfeitores, justificando 
compromissos, regras e submissões religiosas. Por isso, eram benquistos como os 
preceitos vivos da religião mosaica e não pesavam na economia do povo judeu, que os 
ajudava e fazia questão de mantê-los em atividade. No caso de Jesus, o seu ministério 
despertava protestos, ironias, críticas e irascibilidades em certas classes, porque os 
seus ensinamentos não se ajustavam à tarefa comum do rabinato das estradas, pois 
transcendiam corajosamente a tradição religiosa, sacudiam a canga bovina do povo e 
despertavam dúvidas pelo esclarecimento dos dogmas, das especulações e fantasias do 
sacerdócio astucioso. O rabi Jesus não seguia Moisés na sua linhagem doutrinária. 
Seus conceitos eram convites excêntricos que quebrantavam o espírito viril e indomável 
do judeu na sua fé, obstinação e ódio contra o romano. 

A Galiléia era uma região onde a natureza pródiga oferecia a todos os habitantes o 

máximo de formosura, encanto e também de sustento fácil. Os golfos e os lagos da 
Palestina eram extremamente piscosos, sobretudo o lago Tiberíades. O povo vivia 
principalmente de pesca, e do peixe faziam toda sorte de pratos alimentícios, além de 
guardarem fartura de farinha e conservas para o inverno, que não era tão rigoroso. Havia 
frutos em abundância e com facilidade se desenvolvia a apicultura, além da indústria do 
mel de figo. Pêssegos, cerejas, laranjas, peras e o figo eram coisas comuns nos lares 
hebraicos. O pão de centeio, de trigo ou de mel nutria as despensas dos mais pobres e o 
mulherio perseverante e laborioso produzia com facilidade outros meios de alimentação 
pródiga e nutritiva. Não se verificava essa exigência angustiosa das famílias pobres das 
cidades modernas, em que a moeda, ganha com imensa dificuldade, mal consegue suprir 
uma refeição diária. Entre os galileus, a hospitalidade recíproca era um dever proverbial e 
sagrado. Havia um constante fluxo de visitação entre o povo e quando, porventura, 
alguém sentia-se em dificuldade recorria aos mais bem providos, que passavam a 
sustentá-lo até melhores dias e sem quaisquer exigências onerosas. Assim, o beneficiado 
ficava na obrigação de atender, no futuro, outro semelhante necessitado, compensando 
os favores recebidos. Os presentes, as trocas e os empréstimos eram acontecimentos 
comuns, pois naquela gente o sentimento fraterno e a preocupação de servir o próximo 

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