convencional e interesseiro, mas uma oferenda cheia de mimos e de cuidados.
PERGUNTA: — Alhures, dissestes que os galileus eram menos apegados aos ritos
e às obrigações religiosas. Não é assim?
RAMATÍS: — Realmente, isso era verdade. Aliás, a Galiléia ficava ao norte de
Jerusalém e por isso os seus habitantes não podiam freqüentar tão assiduamente o
Templo, como os judeus que ali moravam. Essa dificuldade enfraquecia-lhes o gosto ou o
dever das oferendas constantes, relaxando-lhes o compromisso religioso tão arraigado
entre os jerusalemitas. Pouco a pouco, descuravam de suas obrigações para com o
Templo e à medida que Jesus lhes incutia no espírito a natureza espiritual do “reino de
Deus”, afastavam-se das observâncias exteriores das leis e das prescrições mosaicas,
apegando-se cada vez mais aos rabis itinerantes.
Os galileus jamais poderiam assistir a qualquer cerimônia privada no Templo. Eram
condenados pelos fariseus, porque lhes faltava o espírito de nacionalidade judaica e
ainda admitiam dúvidas ou novas interpretações sobre os ensinos de Moisés,
considerados imutáveis. De outro lado, sofriam os apodos e as críticas dos saduceus
porque, além de lhes faltar a aristocracia judaica, enfraquecia-lhes a confiança nos
sacerdotes e se apegavam mais propriamente aos seus rabis empoeirados. Os galileus,
na realidade, consideravam sua religião como pura emotividade de espírito e não como
ferrenho código moral.
Eis aí alguns rápidos traços do povo galileu que, em sua peculiaridade afetiva, sua
crença religiosa de amor a Jeová, seu temperamento amoroso e hospedeiro, o fizeram a
moldura viva da obra messiânica de Jesus. Assim como o fermento leveda a massa de
farinha e lhe favorece o crescimento, o povo galileu também foi o fermento humano que
deu força iniciática e divulgou o Evangelho do Mestre Jesus, o qual jamais encontraria
tanta afetividade, compreensão e amor para o sucesso dos seus ensinamentos. Ele não
teria nenhum êxito se os pregasse, de início, entre os saduceus orgulhosos e os fariseus
intrigantes, que se apegavam à letra da Lei como o carrapato ao couro do animal. O
povo galileu, alegre, ativo, buliçoso, rixento, sincero na sua fé e puro na sua amizade, foi
realmente o verdadeiro ensaio para o advento do Cristianismo.
PERGUNTA: — Reconhecendo que a paisagem da Galiléia e a hospitalidade dos
galileus foram de influência benéfica, catalisando as atividades de Jesus, gostaríamos
de saber como ele assentou as bases doutrinárias do Cristianismo entre raças tão
diferentes?
RAMATÍS: — Aquilo que vos pode parecer deficiente ou dificultoso, no início da obra
de Jesus, foi-lhe de excelente proveito em face de sua agudeza espiritual e
conhecimento profundo dos sentimentos humanos. As divergências próprias de
indivíduos originários de raças antagônicas, assim como as discórdias comuns entre os
galileus, serviam a Jesus como um verdadeiro ensaio para o seu treino espiritual na
confecção do Evangelho destinado à humanidade. O ambiente em que vivia também lhe
permitia proveitosa auscultação sobre a natureza dos homens, sem necessidade de
percorrer o mundo e então conhecer os variados caracteres da humanidade.
O Mestre não fugia do contato diário com todos os habitantes do lugar, embora
preferisse ficar à tona das cizânias, rixas e contendas de todas as espécies. Em vez de
atear fogo aos conflitos e embates religiosos, ele sempre interferia com a palavra
amorosa e sincera, acima dos preconceitos, costumes e das tradições de raças e de
religião. Graças ao seu sublime entendimento espiritual, conseguia harmonizar o
entendimento sobre os temas expostos e contentava ambos os adversários, quer
amainando as tempestades do personalismo humano, como amenizando as paixões dos
contendores. Os conflitos mais violentos logo perdiam o seu ardor e enfraquecia-se o
ânimo dos rixentos, assim que percebiam a aproximação de Jesus.
Os idiomas ou dialetos, as devoções e os costumes diferentes dos seus conterrâneos
faziam considerá-los como a miniatura da própria humanidade terrena, a qual também
subdividia-se em matéria de fé, sentimento, religião e política.
Jesus meditava sobre a natureza humana ainda tão animalizada e ignorante na sua
insatisfação, avareza, crueldade, cupidez, no seu amor-próprio e orgulho de raça. Essas
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